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maio 15, 2007

fobos (poema)

(Ilustração de Pedro Correia)


I

vinha falar do homem
signo completo a decifrar

primeiro absorve-se o
corpo os actos os fatos
pode mesmo achar-se a dominante
no corte do cabelo
na linha da boca ou
no particularíssimo modo de
estender o passo

entretece-se depois o jogo mais
perverso e subtil
do significado
produção pretensamente espontânea
transferência de gestos e semi-sorrisos
nos jogos das falas

impossível trazer à tona
todo o conhecido

II

entenda-se o homem como uma
fita vermelha embebida de azul
longe do patriotismo médio

denotação de razões
desconhecidas
jogos malabares
com que me divirto a
enxamear o papel de

situações

escuta o abismo da palavra

as palavras respiram
têm substância estalam
obscuras e viscosas e doem
irrecusáveis e ditas

as palavras são
agonias suculentas
revolvem doeres e
perceptíveis incrustam-se
nos cegos olhos das palavras

tenho um novo carregamento
por partir

abram as portas à partirnidade




III

e esta hem
esta metafísica do dizer
esta filosofia do como se diz
o porquê mais conseguido

tudo porque um homem
é o signo do seu signo universal

explicando

um homem passa do ser
à qualidade
em pura imagem se crê
plasma-se
sem contornos
na tela

é plano como o advérbio
que tanta força dá ao que se diz

verdadeira a mente
é lugar onde
se passam muitas coisas que só passam
em absoluto
ali

IV

divirto-me com o jogo

digo
com a vida

o dramático silêncio assusta-se
nas respostas

a canção chama a canção
e esses por vezes letárgicos olhos
do meu amor

respiram nas palavras
das palavras

os barcos são ainda
as catedrais onde se reza ao mar

responde o sol sobre as casas

reconstruí o molhe e o trenó
parado sobre a neve

o jogo pode regressar

V

no papel suburbano de tornear
as fronteiras do mundo
temos o teatro
de novo o jogo

cristo andou por aqui aos caídos
sem perceber o sarilho em que nos
metia

tudo na melhor das intenções

lixou-nos pronto

a malta agora que se aguente
carregue a cruz e vote tacticamente
no partido errado de todas as eleições

eu sou um cidadão cumpridor
vou ali já venho e se puder
não regresso

pois pois o sagrado amor a esta
vidinha parva a deontologia retrospectiva e católica
apesar das esfusiantes negações

platão é que a sabia toda
e não queria poetas na républica

ouve
se me deixares embarcar na utopia
fecho num cofre de banco
a multinacional da poesia

e
vou mentir contigo
a alegria maldita de não ter
que dizer e descansar
na mediocre felicidade actual

porém escuta
o homem é um signo completo

VI

nas órbitas de marte
sócrates espera-nos
na torre da cicuta

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3 comentários:

Anónimo disse...

...tal pai tal filho, outra vez.já agora e para abandalhar a seriedade do poema, não podias mudar o final para "sócrates espeta-nos da torre de cicuta ?

kira
(deve aparecer anónimo porque esqueci, e por isso ando à nora, a senha)

Carlos Correia disse...

Penso que seria um belo final. Só que o fenómeno seria - epero - de curta duração. O máximo mais um mandato e meio!!! O que é que eu disse? Curta duração?!! Porra!!!

Anónimo disse...

Este mecinho escreve muito bem.
É um bocado hermético, mas apesar de tudo as ideias estão lá e os sentimentos também.