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maio 19, 2010

memórias XXI - poema de leiria da tarde e de maria




I

a porta fechou
as praias são só areias
e os países naufragam nos jornais

correr correr e nem sequer é domingo
em que embrulho se meteu a vida
na tarde das naus

já leiria perdeu os seus pinhais e o pintor
em parte incerta desconhece que

a tarde só é tarde quando dói

a maria
olha a vida da confeitaria
em frente ao hospital

e ademais
lembrem-se dos que sofrem
aqui
é proibido buzinar

já leiria perdeu os seus pinhais

os poentes de outono
são das poucas coisas na minha terra
que não têm dono

II

por sua vez o tejo
encheu-me as unhas com parte de um poema

quando os lustres se acenderem
vou agarrar-te na alma e correr pelo rossio
depois da meia-noite
quando as orações são bruxarias
a instaurar a raiva dos centauros

desliga o telefone desligando a vida
porque hoje os faquires vão ao cinema

amanhã irei à florista saber a cor
onde os goivos habitam e
se o poema é a difícil revelação da verdade
não haverá janelas que me falem sobre o que faz
um homem sozinho na cidade

evidentemente

à tarde

maio 13, 2010

Crise, Papa e Fernando Nobre




Pronto, pronto, concedo! Vocês têm razão! Com os problemas da crise a baterem-nos à porta, deixando-nos meios gregos no meio desta confusão, com as ameaças às várias formas que se antevêem de diminuição real do rendimento disponível das famílias, com os desempregados a verem o subsídio a escapulir-se, o reemprego a ser coisa mirífica e a reforma cada vez mais distante e diminuta, porque carga de águas hei-de eu vir repisar teclas já tão batidas como a omnipresença e continuidade da crise, a visita do Papa ou a candidatura de Fernando Nobre à ainda distante nova presidência da república?

Que querem, são madurezas de espírito de quem, dirão os menos afectos a mim e aos meus escritos, não tem maiores preocupações. Tempo de sobra sem ocupação que se veja, pretensão inaudita de Catão provinciano, pequeno moralista protegido das agruras da realidade, pronto a sonhar utopias esquecendo-se que ter jantar na mesa, todos os dias, começa a ser uma preocupação para cada vez mais portugueses. Outros ainda, navegando por diferentes águas dirão que cada um tem o que semeia, que as desigualdades são naturais e que o bem ou o mal-estar de cada um apenas dos seus esforços depende e, nestes tempos de fausto religioso, poderão mesmo acrescentar, que deus dá a cada qual aquilo que merece. Sábias palavras e refinados conceitos. Apenas falham por serem requintadas mentiras utilizadas ao longo dos tempos por todos quanto têm alguma coisa a ganhar com a miséria e submissão dos outros. São realidades recorrentes que se aliviam em tempos de fartura e se carregam nas alturas das crises.

As sibilas do centrão arengam preocupadas sobre o excesso da dívida, sobre o exagero dos créditos às famílias, sobre o custo dos empréstimos e, consequentemente com a absoluta necessidade de cortar despesas e aumentar produções. Andam desesperadas a tentar a quadratura do círculo sem perceberem que se movem num rectângulo que condiciona não só percepção da realidade como, a sua colocação nesse espaço, os aprisiona à consabida e limitada visão permitida por tal perspectiva. Preocupam-se com aqueles que vivem miseravelmente de parcos subsídios permitindo, por isso, aos impantes governantes arrotar as magnificências do modelo social europeu e nada dizem, ou fazem, sobres as fortunas colocadas em “offshore”, os diminutos impostos pagos pela banca, a farsa das tributações das mais-valias em bolsa que, finalmente aprovadas, se “esqueceu” de incluir entre os taxados os grandes investidores, lançando, como cortina de fumo, o imposto sobre os pequenos e muito pequenos negociantes. Enfim, isto sou eu a falar e como sabem, não me podem levar a sério porque, dizem os livros que este senhores neo-liberais consultam, tudo isto não passa de mesquinhez de espírito conduzida por uma imensa inveja social. Vá lá, não sejam egoístas, pensem como estes abencerragens têm razão e predisponham-se, mais uma vez, a pagar com a vossa fome e as vossas necessidades o bem-estar, a ganância e o desperdício de tão ilustres personagens. É que eles detêm o pleno direito a terem o que têm e a ser como são. E mesmo que oficialmente se proclamem desafectos de igrejas e religiões, eles, lá no fundo sabem e agradecem ao deus das distribuições económicas, o direito sagrado que lhes atribuiu de viverem opiparamente sobre a desgraça dos outros. É a lei natural dirão e nisto esquecerão que a lei humana é a da cultura. De que as regras culturais, fundadoras das sociedades, deveriam ser o ultrapassar do tão jacente direito natural representado no domínio do mais forte sobre o mais fraco. No fundo, em nome da civilização e dos actos urbanos querem ver repostas, a seu favor, as desigualdades que dizem não aceitar mas que são o sal da sua vida, do seu estar repimpado nas espreguiçadeiras de uma injusta distribuição de riquezas.

Por tal, mais que risível, é extremamente ofensivo este constante atribuir de culpas, por aqueles que dirigem e dirigiram, aos pobres coitados que sempre sofreram as agruras dos descalabros por eles causados e nunca receberam benefícios nos “bons tempos” que os enriqueceram. Tal estado de coisas leva-me a remorder em solilóquio constante um “isto ainda acaba mal”. E é que vai mesmo acabar da pior maneira possível. Quando se corta no investimento, que poderia criar empregos, gastam-se milhões na recepção do senhor Ratzinger, o tal garante da pureza da fé de alguns padres pedófilos e o tenaz perseguidor e algoz dos padres que, no terceiro mundo, pregavam que sem a libertação e dignificação dos corpos não há almas que possam salvar-se. Por isso ele usa sapatos de conhecida marca e preço astronómico e trás vestido no corpo valores que dariam para alimentar, durante muito tempo, famílias inteiras. Não faz mal, é a humildade de Cristo que ele transporta nesta ostentação. Cá por mim penso que se o patrão dele for o que sobre ele consta este bom Papa já está tramado de todo. Como era mesmo aquela história dos vendilhões do templo?

E o que dizer dos nossos governantes “absolutamente laicos”, cumpridores eméritos da constituição que separa a religião do Estado e manda tratar todas as religiões de igual modo? Pois é! Como em tudo na vida, há religiões que são mais iguais que outras. Se calhar estou a ser demasiado ríspido nas minhas apreciações. É bem possível que por milagre, ou por mais terrena influência do Papa sobre os donos do mundo, as agências de “rating” decidam minorar os seus olhares de abutres sobre o nosso país. Pode ser que os donos do capital, que deslocalizam as empresas para onde não existe protecção para os trabalhadores, conduzindo nesse passo as suas sociedades de origem à degenerescência e miséria, se comovam com a demonstração de fé do bom povo e, por obra e graça da Senhora de Fátima ou do seu filho, seja a nossa dívida resgatada, os juros baixem, a bolsa suba, a produção aumente e leve a um bom acréscimo das exportações – e pormenor sem importância, quais e para onde? – crescendo assim o emprego e, pela justa repartição do rendimento, igualdade de oportunidades e qualificações, este país consiga acertar o passo pela Europa. Mas, tremendo pensamento que me ocorre, não é Jesus Cristo, no dizer do poeta aquele que não tinha biblioteca e nada sabia de finanças? Oh! Diabo! Lembrei-me agora que no seguimento do poema também se dizia que o melhor do mundo eram as crianças.

É maravilhoso como tudo acaba por se ligar e fazer sentido!

Vamos então ficar sem o aeroporto, a ponte e com um esquisito comboio de alta velocidade que irá do Poceirão ao Caia! Coisa admirável e nunca vista! Oh! pedregulhos com dois olhinhos como conseguem tão preclaras visões! Que Keynes vos perdoe e Marx não rebente de ira enquanto Adam Smith e Freedman se riem a bandeiras despregadas de tão incoerentes personagens. Nem sequer conseguem ser inteiramente o que são, ou, talvez mais convenientemente, pretendam ser e apenas consigam, na pequenidade que os habita, as caricaturas que na verdade são e serão.

Ah! É verdade, o Fernando Nobre! Lá o vi, no meio da selecta multidão de convidados a prestar a sua homenagem a sua santidade. Fiquei tramado. Se ele também alinha com a pandilha em quem é que agora vou votar? A qualquer um que tenha conseguido ler até aqui este meu desabafo pergunto se conhecerá alguém, seja de que candidato for, que queira comprar, mesmo que a preço módico, o meu voto?

É que já estou naquela de: se os não podes vencer…


Publicado in “Rostos on line” – http://rostos.pt

maio 05, 2010

memórias XX - canto para a morte de bobby sands





I

disseram-me mesmo agora
aqui no café
que hoje cinco de maio
numa prisão da irlanda
tu morreste

em portugal o sol brilha intensamente
na espuma da bica
numa galáxia desenhada
dobram sinos
pela morte de um homem
que não conheci

no repente da memória
relembro outras dores
com nomes luminosos e aquáticos
e vejo-te cálido e tranquilo perto
de che guevara jesus cristo
pablo neruda garcia lorca
ou outros que morreram
com as dores de todos os homens

II

hoje aqui e a ti
ofereço à tua morte
a minha alma de irmão

na sombra que te cobriu
clamo a minha vingança
desejo que não descanses em paz
nem eu nem qualquer outro amante das coisas livres
enquanto não cair
o último dos tiranos

pouco importa que o vampiro feminino
que a burocracia marcará com o nome
maldito de margareth tombe
ou continue por tempo indefinido no
pressuposto do poder

na realidade que importância tem
que no dia da tua morte o exército inglês
avance sobre as pedras da tua pátria
que importará na verdade
que em cada hora numa qualquer
esquina incógnito
um outro patriota caia
no sangue da liberdade

pouco importa mesmo o passo apressado
com que a humanidade procura
o holocausto tu sabes bobby
o que tiver de acontecer acontecerá
e ninguém mesmo ninguém
por mais exércitos ou prisões
ou polícias que domine
poderá impedir para sempre
o caminho daqueles que não aceitam donos
e procuram nas coisas
a alma das canções

III

a tua morte entoa em nós
um hino de esperança
sabemos de novo que continua a haver homens
para quem a liberdade ressoa
como o brilho das estrelas
ou beijos em bocas
de amantes retornados

que fazer bobby da tua memória
que me aquece e incomoda
como liquidar a dívida para com
a tua morte contraída

só o poderei fazer semeando o sol
que hoje te foi negado
amando em todas as mulheres a amada
que no amanhã que não terás
te faria pegar numa guitarra
e imerso na sombra do luar
fazer fluir um tão imenso canto
que o oceano inquieto pensaria
ter já chegado o dia
da grande redenção

a ti o morto
neste momento levantamos obeliscos
na emoção de cada memória
mais não podemos fazer
que ofertar-tos acrescidos da miséria
das palavras que te digo

mas pensa um pouco

uma palavra não é só um som
uma grafia inscritos no papel
uma palavra
se animada por dentro
por um morto que não morre
é o aço e a água
a pedra e a cal
onde o alimento se encontra
e o momento acontece
em bodas de alegria

uma palavra
inventada na saudade
de um corpo início de viagem
é um solene contrato
entre o sangue e as veias o cérebro e o coração


uma palavra é um tributo
onde o oiro prevalece
sem o horripilante jogo
das fronteiras e uma
sentença de morte
para quem procura
a morte das palavras

uma palavra
é o que resta da vida
para todo o sempre

IV
por isso perdoa
por fracas as palavras
com as quais luto contra o esquecimento
e pretendem levantar o monumento
em que o teu nome perdure
e tu continues homem junto aos outros homens
um pouco mais distante é certo
porque prevaleces no âmago de cada um
acendendo o facho da revolta
para aquecer esse pedaço de vida
sonegado
V
foi há pouco que me disseram
que hoje cinco de maio
numa prisão da irlanda
à uma hora da manhã
quando a esperança se começa
a delinear nos lábios da alvorada
numa noite em que a lua
de vergonha não apareceu no céu
subitamente bobby me foste mais irmão

por isso eu estou nesta margem
entre a raiva e o choro
e a minha mão nervosa
traça o papel em signos restritos
na inominável relação que existe
entre o que deste e a relativa
comodidade desta revolta
em que me encontro instalado

por isto insisto nestas frases
e tento o poema
processo a chama onde possa arder
o meu pálido reflexo
do teu poema escrito
com o sangue generoso que te doaram
outros que passaram e como
cristo neruda ché ou garcia
sabem que neste instante
o caminho passou
por uma prisão na irlanda
onde pelo início do dia
ainda noite recolhida
em busca da liberdade um homem livre renascia





Barreiro, 5 de Maio de 1981

maio 01, 2010

O Hospício - (ou quem há-de gabar a noiva)




Abstraído na leitura do jornal só acordei para o mundo quando um amigável porradão nas costas me fez ejectar meia bica direitinha para a página, de quotidiana desgraça, onde a minha atenção se concentrava.

Então, agora deste em actor? Perguntou-me de chofre antes que o pudesse cumprimentar e limpasse o nariz, por onde parte do café, desagradavelmente, encontrara espaço de saída. Era, como não podia deixar de ser o impagável Belegário. O homem parece, por vezes, que é bruxo. Passo tempos sem o ver mas, sempre que algo diferente acontece na minha vida, lá me aparece ele, supimpa, sorridente, sem remorsos ou pudor, inopinado a interceptar os meus percursos.

Olá, Belegário, pelo menos diz bom dia. Resmungou um sumido “bdiapá” e voltou de imediato ao que lhe interessava. Estava para te telefonar mas achei melhor ter um bate papo pessoal contigo por causa da peça. Foste ver? Ná! Só gosto de comédias. Para mim o teatro é para depois de um bom jantar e uns copitos no bucho ir dar umas gargalhadas com as maluquices e as piadas dos actores. O que me traz atarantado é como te foste meter nessa alhada. Já tinhas idade para ter juízo. Então juntas-te a um grupo de comediantes assim sem mais nem menos? Olha lá, disse, o que é que isso de comediantes e o que é que tens contra eles? Pareces um velho do século dezanove eivado de preconceitos de classe. É pá, mas o que é que vão pensar os teus antigos colegas das direcções das empresas ao ver-te nessas andanças. Não sei, repliquei, nem tal me preocupa, uns acharão mal, outros divertir-se-ão com a ideia e outros ainda, mais amigos ou conhecedores do meu feitio iconoclasta encolherão os ombros com um sorriso e, compreensivelmente, dirão ele foi sempre assim.

Pois, pois, mas estou curioso por saber como te foste meter nisso, Conta lá, pá!

Foi simples, um dia o Luciano Barata telefonou-me para me convidar para fazer um papel na peça que, no Grupo Projéctor, o Abílio Apolinário estava a encenar. A peça era O Hospício, também conhecida como Marat/Sade, ou no título original - e prepara o fôlego para poderes repeti-lo - “Perseguição e assassinato de Jean-Paul Marat representada pelo Grupo Teatral do Hospício de Charenton sob a Direcção do Marquês de Sade”. Claro que fiquei um pouco baralhado. Já não fazia teatro desde o Secundário e esta peça, eu conhecia-a, tinha-a visto há umas dezenas de anos na Comuna, com actores do gabarito de Carlos Paulo (Marat) e Carlos Wallenstein (Sade) e conhecia bem a complexidade do texto e as dificuldades de encenação e interpretação de figuras e época. Não tremi com o convite porque pensei que apenas necessitavam de mim para fazer número no conjunto dos doidos do hospício e lá fui, ao Bar do Franceses, falar com o meu amigo Luciano e com o desconhecido, e agora também amigo, Abílio. Ao saber que ele tinha estado na Comuna e que tinha participado no Marat/Sade, percebi que iríamos falar de um teatro de ideias, de encenações radicais e de uma experiência arrojada, tendo em conta as dificuldades da peça e a exigência cénica, histriónica e de interpretação exigidas por este texto de reconhecidos méritos mundiais, bem como o espaço e maquinaria teatral existentes. Entusiasmou-me o arrojo da ideia e fiquei logo conquistado para o projecto. Só fui acometido pelo terror quando, impudicamente, me propuseram o papel de Marat. Não me parecia estar ao meu alcance encarnar aquela tremenda figura de revolucionário jacobino, bem como ter ainda capacidades de memorização para as profundas e imensas falas da personagem. Após longo conciliábulo lá me decidi, a título meramente experimental, testar as minhas capacidades. Abro aqui um breve parêntesis para te dizer, Belegário, que outro tanto se passou com o Mário Durval, o qual, de igual modo, acrescentando com generosidade mais este aos seus muitos afazeres, decidiu entrar no barco.

Sobre o trabalho insano que foi para todo o grupo pôr em cena esta peça não vou falar-te senão para sublinhar que neste conjunto, onde não há actores principais e figurantes – cada um fazendo à vez, em cada peça, o papel que lhe é distribuído - se encontra uma vasta plêiade de talentos, espírito de sacrifício e boas vontades, todos empenhando-se, de igual modo, no conseguimento da percepção e ritmo da obra, entregando-se profundamente ao seu conseguimento, conscientes de que um menor empenhamento pessoal poderia fazer soçobrar o esforço colectivo.

É pá, interrompeu-me o Belegário, mas não achas que é uma grande estopada passar duas horas a ver malucos e ouvir discursos inflamados sobre a Revolução Francesa? Eu sempre detestei esse período da história. Para mim foi sempre uma confusão de acontecimentos, nomes e cortes de cabeças. É bem verdade, respondi-lhe, mas não te esqueças que ainda hoje, os direitos humanos por que sempre te andas a bater, e que por vezes te põem de mal com deus e com o diabo, são o resultado dessas lutas. A América que diga onde foi beber os seus ideais de liberdade e onde baseou a sua Constituição. E as nossa também! Mas passemos adiante e falemos mais na peça e no autor. O Peter Weiss, nascido na Alemanha, refugiado em consequência das perseguições nazi, escreveu esta peça em 1964. Caso raro com as grandes obras, foi logo um êxito. Com certeza que o período de intensa mudança social em que apareceu contribuiu para a sua afirmação. O tema, a linguagem, a intencionalidade assentavam como uma luva nas mudanças que se preparavam em todo o mundo e que vieram a ter os seus corolários nos movimentos de 1969 e posteriormente, nos anos 70, inclusive em Portugal. O texto desta peça foi perfeitamente compreendido como actual naquelas décadas e, facto notável, volta a estar novamente em dia nos tempos que correm e no nosso País. Mais uma vez Jacobinos e Girondinos – com outros nomes e outros discursos – se confrontam num mundo em crise de transição e, talvez não muito distante no tempo, revolta. Para te aperceberes, vou socorrer-me de análises de várias pessoas e fontes (entre elas a entrada Peter Weiss da Wikipédia), sobre os três níveis diferentes mas simultâneos em que a acção se situa:

O Primeiro nível é situado em 1808. Sade está preso, pelas suas ideias e práticas, no Hospício de Charenton. Escreve aí algumas das suas obras mais conhecidas e, como forma de tratamento de doentes mentais encena peças, no Hospício, a que assistem as classes superiores da sociedade revolucionária francesa. São personagens deste nível Sade, o Director Coulmier e os doentes.

O segundo passa-se em 1793 quando a Girondina Charlotte Corday assassina o líder Jacobino Jean-Paul Marat, plumitivo, deputado do povo e absolutamente radical. Aqui pontuam Marat, Charlotte Corday, Duperret – deputado girondino e amante de Charlotte – e Jacques Roux, padre e radical apoiante de Marat.

“A terceira esfera temporal (ou nível) é a do leitor que lê ou assiste à peça, podendo ser tanto público da peça de Weiss como da peça de Sade”, cabendo-lhe a ele as identificações do discurso e a sua adesão às realidades presentes.

Por isto o Grupo Projéctor fez um esforço imenso para que a peça fosse apresentada no dia 25 de Abril. Como ainda a não foste ver, terás possivelmente algumas dificuldades em apreender o sentido profundo desta última “esfera temporal”. Por isso te recomendo vivamente que não a percas – desculpa-me este descarado gabar da noiva pelo noivo – porque não darás por mal-empregado o teu tempo e, muito possivelmente sentirás como és tu também personagem e actor de um drama semelhante e actual passado nos conturbados tempos que o mundo em geral, e o nosso país em particular, atravessam.

Vai, em qualquer dos fins-de-semana de Maio, aos Franceses ver a peça. Leva a família e os amigos. Vão ver que não se vão arrepender.


Publicado in “Rostos on line” – http://rostos.pt

O Hospício - Fotos




Marat (Carlos Alberto Correia) e Simone (Elsa Barata). Ao fundo, em segundo plano, Jacques Roux (Mário Durval). Em primeiro plano o Guarda (João Martinho)


Doentes, Coro, Apresentador Marat e Simone



















Em primeiro plano, Marquês de Sade (Manuel Gonçalves) e Apresentador (João Cruz)

























Em segundo plano Doente (Luciano Barata). Em primeiro plano Duperret (Emanuel Saramago)





















Em cima Coulmier (Luís Gonçalves). Em baixo, ao fundo, da esquerda para a direita, Doentes (Luciano Barata, André Pereira, Maria João). Em primeiro plano Marquês de Sade (Manuel Gonçalves)















Ao cimo, Coulmier (Luís Gonçalves), em baixo, da esquerda para a direita, Doente (Maria João), Enfermeira (Fátima Pires) e Charlotte Corday (Tânia Pacheco)











Doentes , da esquerda para a direita, (Manuel Graça e Rogério Rosa









Doente (Risete Dias)


Ao fundo os músicos, em segundo plano um
doente (Rogério Rosa), em primeiro plano Simone (Elsa Barata) e Marat (Carlos Correia)




As quatro cantoras, da esquerda para a direita, Tourlourou (Lara Nair), Sansonnet (Daniela Pedroso), Cocorico (Vanessa Rodrigues) e La Fauvette (Romy Mendonça)