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abril 05, 2007

Uma questão de equilíbrio

Ele há coisas que parecem mentira.

Esta semana, fui acometido, por um surpreendente síndrome vertiginoso que me fazia parecer um ébrio a querer andar em linha recta. As coisas, estranhamente, pareciam todas fugir da sua vertical e bambolear-se ao ritmo de imaginárias ondas de mar. Assim descrito pode parecer poético mas, na verdade é apenas desesperante e patético. Ainda por cima para mim que, por ser Balança e intelectualmente estruturado pelas Ciências Sociais, procuro desesperadamente a comparação e equilíbrio dos eventos.

Dirão, os que tiverem pachorra para acompanhar este arrazoado, por que carga de água está este tipo a sobrecarregar-nos com os seus problemas pessoais? Ou se pensa muito importante ou julga que nada mais temos que fazer na vida que aturar os seus problemas. E seria muito bem dito se fosse só isto o que eu viesse ao mundo virtual comunicar.

Mas não! Outras coisas hão de “mor espanto”!

Trabalha há muitos anos, em minha casa, uma mais que empregada, amiga, que, por motivos de saúde, teve que ser hospitalizada por longo tempo. Não, não vou dizer mal do sistema de saúde nem atacar o ministro. Esta explicação tem somente a ver com o facto de ter tido que me socorrer, temporariamente, de uma outra pessoa para assegurar o asseio suficiente da casa.

E lá está ele, dirão, a continuar a maçar-nos com a sua vida particular. Grande engano! O que se passa é apenas um engodo para levar o leitor, inicialmente desconfiado e reactivo, a abrir as guardas com estas confissões pessoais, a fazer de si um amigo de trato longo e confiado, para melhor lhe vender o meu peixe, quando o momento for azado.

O motivo de trazer à baila a empregada substituta e o meu síndrome vertiginoso (o nome é um espanto, não é?) prende-se com o tempo mais largo que tive para conhecer a senhora. Numa conversa, não muito longa, contou-me que tinha estado a ler um livro que a impressionara imenso. Recordo o título de cor: ”Deus chorou no Afeganistão”. O seu espanto derivava, segundo me disse, não tanto do relato dos acontecimentos, porque gostava muito de ler livros de história e devorava tudo sobre a Segunda Guerra Mundial, mas porque o que lia nesses livros, por horrível que fosse, era passado e o que lia sobre o Afeganistão estava ainda a decorrer. Rematou na ignorância do síndrome que eu sofria:

- O que falta no mundo é equilíbrio!

Nada mais precisaria de ser acrescentado a esta sentença. No entanto lá fomos falando de como a riqueza do mundo estava mal distribuída; como se a ganância fosse moderada ninguém teria de passar fome, de ser condenado a morte por doenças que se podem curar num ápice e que matam uma grande parte da humanidade; que quantas mais riquezas existem nos países – referia-se ao dito terceiro mundo – maior é a miséria do povo, que não havia razão para as pessoas serem desapossadas da sua dignidade pela miséria e que o mundo, desta forma, não chegaria a bom porto. Rematando: - e no entanto bastava um pouco de equilíbrio!

Foi por isso que eu cometi o risco científico da analogia. Entre o meu estado vertiginoso e o mundo que nos rodeia havia algo de similar. Se eu, diagnosticado o sintoma procurara e conseguira uma terapêutica que tudo parece indicar ser de eficácia suficiente para me repor em condições normais, não poderia mandar o mundo ao médico para que ele lhe receitasse umas pílulas que, ao menos, lhe atenuasse a tentação do abismo?

Levantei-me, cheio de boas intenções, disposto a mostrar ao mundo a sua insanidade e vertigem, certo de que conseguiria despertar algumas boas consciências para este obra fundamental de equilibrar toda a gente que busca equilíbrio e zás! tropeço no noticiário da rádio que me enviou, de novo e rapidamente, para um síndrome vertiginoso, o qual nada tendo a ver com este, pessoal curável a comprimidos, mais parecia raivosa cascata de ignoto oceano a precipitar-se no espaço vazio, nas fronteiras imaginadas do mundo de Quinhentos.

Publicado in “Rostos on line” – http://rostos.pt

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