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fevereiro 26, 2006

A Arte de ensinar a matar dragões

Estive para começar esta crónica usando a conhecida frase “naquele tempo”…mas tive receio que considerassem tal forma um abuso de liberdade de expressão e, tresloucados, viessem ara a rua católicos fundamentalista ou, pior que isso, alguém apresentasse queixa ao Senhor Procurador-Geral da República.

Desta maneira, autocensurei-me, usando da minha melhor dose de responsabilidade e resolvi, para evitar danos de maior, começar de uma maneira menos comprometedora. Portanto cá vai:

Era uma vez… (haverá já criancinhas furibundas na rua?) Pois então lá vai o que era dessa vez.

Na velhíssima China de há mais que muitos anos nasceu uma criança a quem deram o nome Fun Leong – o nome fui eu que o inventei e espero que não signifique qualquer coisa de ofensivo para os chineses – e que, por desgraça, nasceu oficialmente filho de pobre. Digo oficialmente porque vocês sabem como são estas coisas! A mãe era jovem e “bem-parecida” e o Mandarim da terra, por questões que não se percebem bem, mesmo antes da criança nascer, sempre teve para com aquela família abundantes desvelos. Tão grandes que se poderia dizer que foi como um pai em toda a vida do nosso Leong.

A criança, de esperta que constantemente foi, nem parecia provir de meio de tão escassos recursos. Como todos sabem e não preciso de perder tempo a explicar o que é óbvio, a inteligência das crianças, desde sempre, está na razão directa do meio em que nascem. Se disto alguém tem dúvidas consulte as estatísticas e veja, com olhos próprios, a evidência das minhas afirmações.

Para que capacidades tão raras se não perdessem o bom Mandarim tratou de ensinar e conseguir mestres que educassem o rapazinho. Que nunca desiludiu. Da prática à teoria, do desenho de caracteres à argumentação, era sempre o mais rápido e ladino. Por isso, para abreviar, o Mandarinato estava-lhe mesmo a cair na sopa. Tais provas de argúcia deu, tais aptidões demonstrou perante os examinadores que lhe foi destinado o mais difícil e prestigioso curso, a saber: A Arte de matar dragões.

Como era de prever foi o primeiro classificado da sua formatura e, com os outros companheiros, mal se viram habilitados partiram, cada qual para seu canto do vasto mundo, para meterem em prática, com a máxima coragem e eficiência, a difícil arte a que se consagraram.

Alguns anos passados voltaram estas promissoras criatura a encontrar-se para comunicar aos outros as suas fortunas. Mas - valha-me qualquer coisa que se creia como sobrenatural e que não me atrevo a nomear - dos exuberantes jovens partidos regressaram fontes encanecidas, nenhum ar da esperada opulência e nos rostos, mais que desilusões, reflectia-se o pânico da inutilidade. É que, todos eles, nem sequer com a excepção do excepcional Leong, em parte alguma do mundo, encontraram dragões em que pudessem exercer a sua arte ganhando glória e proventos.

Assim estavam as coisas: - Lamentos, tristeza infinita e o que é que vamos fazer?

Das reflexões longas que efectuaram ninguém conseguiu arranjar saída para tão crítico estado de coisas.

É natural que me perguntem: Então e o Leong, essa tão brilhante esperança, nada tinha escondido nas consabidamente longas mangas da túnica?

Claro que teria e o que eu fiz foi um pequeno truque de autor para aumentar o suspense e o tamanho do escrito (vício que me ficou de quando me pagavam artigos à linha). Portanto, no meio da depressão colectiva, elevou-se a voz do nosso herói que disse:

-Meus amigos, nada de desesperos. Somos a casta letrada e detentora de todos os conhecimentos do Império do Meio. Mal seria se para tão parco problema não houvesse nas nossas esclarecidas mentes cabal resolução.

Pasmo e bocas abertas entre os sábios em conclave… (oh! Diabo, querem ver que vou arranjar outro problema por falta de responsabilidade no uso da liberdade de expressão? Vou esperar 24 Horas para ver o que dá.) … adiante, ia nas bocas abertas e nas expressões “confucianas” daqueles reunidos (assim é mais anódino e está melhor, não está?) uma expectativa dolorosa preste a rebentar em gritaria.

Para que tal não acontecesse, o que seria basto desprestigiante par os dignos mandarins, resolveu-se, finalmente, Leong, a expor a sua ideia.

Camaradas (ai, ai, ai…) já que tanto sabemos sobre a Arte de matar dragões e também sabemos, de experiência feita, que dragões não existem o melhor que temos a fazer é mantermo-nos unidos e utilizar os nossos conhecimentos, para proveito dos outros, abrindo uma nova Escola Superior da Arte de Matar Dragões.

Reza a lenda que assim se fez e que o êxito foi tal que, de todas as partes do Império, chegavam pedidos para a abertura urgente de novos pólos de tão importantes estudos.

A história está contada e não tenho qualquer conclusão a tirar dela e se alguém, mal intencionado, encontrar qualquer semelhança entre esta lenda e o que se tem passado em algum país, que não nomeio, tal poderá, ou não, ser considerado pura coincidência.

Cada um que em sua consciência decida!

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