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novembro 12, 2008

Manifesto




A Jorgete enviou-me este texto por e-mail. Não resisti e pedi-lhe que me autorizasse a publicá-lo. Autorização concedida e texto na "berra".

Que se medite...





Dizem alguns que nada podemos fazer contra um sistema de mil tentáculos, manipulador da justiça e das opiniões ;
Dizem outros que nada se consegue contra dirigentes empedrenidos que apenas enxergam os cifrões que vão conseguir amealhar com a morte do ensino público e muito mais com os milhares que hão-de conseguir com a fomentação do ensino privado;
Dizem os nossos chefes que a lei é para cumprir, que não temos poder para ir contra as regras instituídas;
Ameaçam-nos outros mais ou menos veladamente, com processos, com despromoções, com o congelamento das carreiras;
Outros ainda se mostram compungidos, martirizados e solidários, mas...nos atulham de papeis, de fichas, de planos, de prazos a cumprir;
Os senhores do momento enchem os jornais com mentiras ditas como se fossem verdades e ninguém os desmente.
Pairam sobre nós fantasmas do passado. O medo instala-se e a habitual acomodação lusitana nos aconselha a cruzar os braços.
Mas 120.000 encheram as ruas e o minuto de silêncio total, durante a Marcha, foi mais ensurdecedor que mil gritos e deu a resposta de uma classe que não está morta.
Uma classe que ensina às suas crianças e jovens, como um valor de cidadania, que devemos ser íntegros e lutar por aquilo que achamos justo.
Uma classe que é formadora de novas gerações e por isso deve ter a coragem de dizer : Basta!
E os milhares que encheram a Baixa de Lisboa honrarão o seu compromisso e dirão não a esta avaliação. E os milhares que ergueram as suas bandeiras honrarão os gestos e as palavras e dirão: Somos professores! Nós temos a força da razão e mais do que qualquer outra classe, podemos mudar o mundo.
Sim, nós podemos.



Maria Jorgete Teixeira

3 comentários:

Anónimo disse...

Um texto que coloca a tónica na essência da questão. Ensinar aos jovens que podem desprezar o conhecimento que simbolicamente a figura do professor encerra é um acto criminoso e até suicidário se pensarmos nas gerações de jovens que já hoje fazem o futuro. E qual é este? Um que se pauta pela indiferença quanto ao ensino público, visando a sua destruição e hipocritamente enunciar uma suposta moralização. Sim essa é a meta. Por isso, a autora pôs o dedo na ferida. Que importa se há competências adquiridas e cidadãos bem formados, actuantes? Importa mais uma estatística certinha. Decrete-se que a partir de hoje Portugal atingiu plenamente o sucesso, anulou insucessos! Decrete-se que somos um país culto, ainda que as aprendizagens e sua qualidade sejam secundárias. Mas eu ainda lembro o sonho que sempre me conduziu: ensinar, educar, ajudar a construir identidades, cidadãos capazes de intervir... e quero continuá-lo. Recuso uma escola que secundariza este meu papel.

Teremos de dizer : Basta ! Não passarão. A nossa dignidade está em jogo e o futuro do país também.
Em meu nome, em nome dos meus alunos a quem dou tão menos do que dei durante 28 anos repito:basta

Fernanda R. Afonso

prof.essa disse...

Olá Fernanda,
concordo plenamente contigo. Hoje, os meus alunos do 12º perguntaram-me por que ainda me dava ao trabalho de querer saber mais e de querer investigar. Disse-lhes que quando a indiferença se apoderar de mim, sairei do ensino. De seguida,e por estar «de rastos», perguntaram-me, muito surpreendidos, por que me preocupava com eles e com a escola,e respondi-lhes, sem reflectir,que era porque gostava deles. No entanto, pergunto até quando terei energia para me preocupar com a minha formação e os meus alunos? Estou no limiar da resistência física, com 5 turmas com 28/29 alunos, aulas «lectivas» de apoio; actividades na escola e um sem número de trabalhos e de testes para ver e fazer. Meus filhos protestam. Meu pequenino fez hoje um desenho em que me colocou sentada na cama a ver trabalhos ( e eram muitos )e ao computador também rodeada de papel. Pergunto-me se valerá a pena investir nos alunos e descurar os filhos? Pergunto qual o preço que vou pagar pelo quase abandono filial e tudo em nome do quê? Da ainda dedicação à escola.Se a maldita avaliação vencer, e quando se comprovar que não passa de uma grande hipocrisia e mentira e quando me sentir defraudada, então talvez siga o conselho dos meus alunos e deixe de me importar, será mais fácil para os meus filhos.
Carolina André

Anónimo disse...

Olá Carolina!

Um retrato perfeito da tristeza, da depressão que se apoderou de nós. Não será por acaso que crescem os números de depressão entre professores. Como dizes o lectivo passa a não lectivo e nós, que não soubemos nunca ignorar, deixar de gostar dos nossos alunos, não sabemos fazer mal... e corrigimos trabalhos, para além de testes, damos-lhes, como no nosso clube de teatro, saberes outros como os artísticos... Pois, e a nossa família? Estóica, aguenta porque nos ama. Mas até isto tem um limite. Também ela quer atenção, pois merece. Também ela está doente... O que dizes do teu pequenino está a acontecer exponencialmente. É caso para dizer, glosando o poeta, «E aos filhos dos professores, senhor, porque lhes dás tanta dor?». Abandonados, sem atenção de qualidade, eles são vítimas supremas. A mãe, o pai já nem sempre os pode ir buscar à escola ( dirão que outros também, não. Certo, mas não ocuparão noites e finais de semana com o escritório diante dos olhos). Vivem entalados entre escolas e trajectos rápidos! Ouvem frases crispadas, dizendo não faças birras! Cala-te , a mãe, o pai estão a trabalhar.
Como dizia o marido de uma colega que está em depressão profunda ( filho com notas e comportamento escolar terríveis): Tu, a escola estão a destruir a nossa família, a nossa vida. Nenhuma empresa exige isto dos seus empregados!

Trucidados! Entalados! Sem tempo para respirar. Sem forças para buscar ar, arrastamo-nos, arcando as nossas culpas reais ( as que temos para as famílias e para connosco) às que o ME nos assacou e divulgou pela opinião pública. E em bom terreno semeou. Numa classe que vive em função do dever face a alunos, pais etc.Pois, é que nós não pararemos. Arrastar-nos-emos. Sacrificaremos tudo. Choraremos as perdas afectivas: os pais que morrerão daqui a poucos anos, ou amanhã, os filhos desavindos que não têm colo, os maridos e mulheres sem tempo para a cumplicidade a dois. Assim nós, os professores: autómatos numa cadeia de montagem, qual a de uma fábrica.
Perderemos tudo, teimosamente respondendo a necessidades, a outras necessidades de alunos e, ainda, a burocracias, projectos ( de que até gostamos), reuniões, etc...

Adoeceremos ( já estamos não?) e desaparaceremos da escola. Ficará a mágoa, o susto de colegas..., o horror das nossas famílias ... Depois, depois, ninguém lembrará.
Depois o silêncio.

Ps: ontem um aluno, olhou-me com olos de gente e disse-me condoído, perante as profundas olheiras que negras ( nosso emblema): A profª está mesmo bué cansada.
As lágrimas afloraram. Até o Rafa notara. Ora, eu estava habituada a fazer passar uma cadeia esfusiante de alegria, de incentivo...

Onde páras tu, profª fernanda Afonso?

Sem comentários.



Fernanda R. Afonso